Viúva pode reclamar danos morais por cobrança de dívida inexistente em nome do falecido
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu ao cônjuge sobrevivente o direito de pleitear indenização de danos morais pela cobrança de dívida inexistente contra o nome do falecido, mesmo que o suposto fato gerador da dívida tenha ocorrido após a morte.
Com a decisão, a empresa A. E. T. e Cia. terá de pagar indenização por danos morais a uma viúva cujo marido teve o nome incluído nos órgãos de proteção ao crédito dois anos após seu falecimento. Acompanhando o voto do relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, a Turma proveu parcialmente o recurso da viúva e do espólio do falecido contra a empresa.
O recurso discutia a legitimidade da viúva e do espólio para o pedido de indenização por danos morais, bem como a legitimidade da viúva para o pedido de declaração de inexistência do contrato de cartão de crédito.
A Turma concluiu que o espólio não pode sofrer dano moral por constituir apenas um conjunto de bens e direitos, representado pelo inventariante para questões relativas ao patrimônio do falecido. Para os ministros, no entanto, a viúva detém legitimidade para reclamar a indenização pelos prejuízos decorrentes da ofensa à imagem (direito de personalidade) do falecido marido.
Em seu voto, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino comentou que já é corriqueira a ação de pessoas inescrupulosas especializadas na contratação de cartões de crédito com o CPF de pessoas falecidas.
Como a administradora do cartão de crédito, normalmente, celebra seus contratos via telefone ou internet, sem exigir a presença física do consumidor, ela só toma conhecimento da fraude quando deflagra os procedimentos para cobrar as faturas não pagas.
Segundo o ministro, a jurisprudência do STJ é tranquila no sentido de que o apontamento indevido do nome de consumidores em órgãos de proteção ao crédito produz danos morais, gerando obrigação de indenizar por quem procede à inscrição. Porém, ele observou que a peculiaridade no caso era a celebração do contrato de cartão de crédito após o óbito do usuário.
De acordo com Paulo de Tarso Sanseverino, os direitos de personalidade se encerram com a morte da pessoa natural, como fixado no artigo 6º do Código Civil, mas na doutrina jurídica restam dúvidas sobre a possibilidade de alguma eficácia post mortem de tais direitos.
Depois de enumerar as posições doutrinárias a respeito, o ministro afirmou que na legislação brasileira, a exemplo do direito português, “há previsão legal expressa de proteção post mortem desses direitos em alguns casos específicos”.
Ele citou os artigos 12 e 20 do Código Civil, que tratam de direitos de personalidade e cujos parágrafos únicos preveem a legitimidade ativa do cônjuge sobrevivente ou de parentes. Nas Jornadas de Direito Civil promovidas pelo Conselho da Justiça Federal, foi aprovado o entendimento de que essa legitimação se estende ao companheiro.
“O espólio não pode sofrer dano moral”, disse o ministro, “mas o cônjuge e os herdeiros da pessoa falecida podem postular uma reparação pelos prejuízos causados, após a sua morte, por um ato ilícito que atinge sua imagem e memória.” Com isso, a Turma deu provimento ao recurso para restabelecer a sentença em relação aos danos morais.
Quanto à legitimidade da viúva para pedir a declaração de inexistência da dívida, Sanseverino afirmou que o contrato do cartão de crédito poderia repercutir em seu quinhão hereditário. “Tanto o espólio quanto a viúva tinham interesse e legitimidade de ver declarada inexistente a obrigação. Esta enquanto herdeira legítima, e aquele como responsável pelas dívidas deixadas pelo falecido”, disse o relator.
Fonte: Superior Tribunal de Justiça